quarta-feira

"Quero estudar"*

"Temos uma semana de férias. A minha mãe chama-me à parte: - MInha filha, tenho uma coisa para te dizer.
Respondo-lhe: Mamã, se tens alguma coisa para me dizer, diz! Não deves guardá-la para ti...
Mas as primeiras palavras aniquilam-me: - Receio que seja esta a última vez que vais à escola.
Abro muito os olhos, encaro-a e pergunto-lhe: - Como podes dizer tal coisa? Hoje em dia, não se pode viver sem estudar. Até mesmo um camponês precisa de conhecimentos para cultivar a terra; caso contrário, não colhe.
A minha mãe insiste: - Tu e os teus irmãos, são três a ir à escola. Só o vosso pai trabalha, longe. Não é o suficiente.
Pergunto-lhe, com o coração despedaçado: - Significa isso que terei de voltar para casa?
- Sim, responde-me ela.
- E os meis dois irmãos?
- Os teus dois irmãos poderão prosseguir os estudos.
Insurjo-me: - Por que podem os rapazes estudar e as raparigas não?
A minha mãe esboça um sorriso cansado: - Ainda és muito nova... Quando fores crescida, compreenderás.
Este ano, não há mais dinheiro para a escola. Estou de regresso a casa e cultivo terra para subsidiar os estudos dos meus dois irmãos mais novos. Qunado penso nos risos da escola, sinto quase a impressão de ainda lá andar. Como desejo estudar! Mas a minha família não tem dinheiro.
Quero estudar, mamã, não quero voltar para casa! Se pudesse continuar eternamente na escola, seria magnífico".
Ma Yan 2 de Maio de 2001

* in O diário de Ma Yan - A vida quotidiana de uma criança chinesa, Prefácio e notas de Pierra Haski, Edições Asa. Recomendo a leitura.

3 comentários:

Anónimo disse...

Em Portugal, aconteceu-me quase o mesmo em 1960. Só o meu irmão podia continuar os estudos, só porque era homem. E eu até era muito melhor aluna! Felizmente tive uma óptima professora que conseguiu convencer os meus pais da injustiça. Só muito tarde consegui ter boas relações com o meu irmão, por causa desta e doutras discriminações.

escola de lavores disse...

Cara anonymous,
Ainda bem que naquele tempo houve uma professora com visão! E ainda bem que conseguiu gerir e ultrapassar os problemas que surgiram dessas diferenças.

Anónimo disse...

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